O Tempo e o Arco Iniciático das Cartas

16-10-2025
"Nada nos pertence, Lucílio, excepto o tempo" 

Séneca

Quinta-feira, consagrada a Júpiter, é o dia do mestre interior, da expansão e da sabedoria. É o momento de compreender o sentido oculto das coisas e integrar a experiência na totalidade do ser.

As cartas que se revelam, na tiragem desta manhã para este dia — O Mago (I), O Mundo (XXI), A Morte (XIII) e O Dependurado (XII) como carta de fundo — formam um arco iniciático completo. O Mago representa o princípio criador, a consciência que desperta e age sobre a matéria. O Mundo simboliza a realização, o cumprimento do ciclo, a integração de todas as polaridades. A Morte, por sua vez, indica o ponto de viragem inevitável, o momento em que o movimento criador se desfaz para dar origem a um novo princípio. E O Dependurado, sustentando todo este conjunto, é o mediador silencioso que compreende o mistério da passagem e da entrega — aquele que vê o mundo de cabeça para baixo e reconhece que a vida só continua porque se entrega ao fluxo do tempo.

Neste alinhamento, Júpiter fala de crescimento através da aceitação dos ritmos cósmicos. A expansão não se dá por acumulação, mas por compreensão: compreender que tudo o que nasce, se cumpre; tudo o que se cumpre, morre; e tudo o que morre, renasce num plano mais vasto. A energia do dia apela, portanto, a uma confiança profunda no movimento das coisas — um saber que nasce da entrega, e não do controlo.

Cronos é o arquétipo original do tempo como força devoradora.

Ele gera os filhos (as formas, os seres, os instantes), mas não os pode tolerar, pois cada nascimento ameaça o seu poder. Assim, engole-os — como o tempo engole tudo o que nasce.

No entanto, há um filho que escapa: Zeus, símbolo do espírito ou da consciência desperta.

Zeus derrota Cronos e instaura uma nova ordem — o tempo linear e ordenado do cosmos (a cronologia).

Mas o mito mantém a ambiguidade: o tempo, mesmo domado, continua a ser uma força que cria para destruir. Cronos é o tempo natural, entrópico, cego. Zeus é o tempo interiorizado — o tempo da consciência, que observa o fluxo e o domina.

A alma humana vive entre os dois: devorada e desperta.

Mas aqui, o mito de Cronos ganha um novo significado. Cronos, o deus que devora os próprios filhos, representa o tempo que tudo consome — inclusive o que ele mesmo gerou. Contudo, o que Cronos devora é apenas a forma, não a essência. O fogo da consciência, como o do Mago, renasce a cada instante — e é nesse renascimento que se cumpre o ciclo jupiteriano da sabedoria. O tempo, tal como o corpo, é o veículo do eterno retorno.

Séneca, nas suas cartas a Lucílio, dizia que o tempo é o único bem verdadeiramente nosso. Não porque o possuamos, mas porque o vivemos — porque nele exercemos a única liberdade possível: a do espírito que aceita o seu fluxo e encontra serenidade no instante. A verdadeira expansão, portanto, não está em dominar o tempo, mas em viver o instante — esse batimento entre o ser e o não ser, onde tudo se cria e se dissolve.

E é aqui que Nietzsche e o Tarot se encontram. O eterno retorno de Nietzsche não é uma condenação à repetição, mas a afirmação do ser que aceita o devir como parte de si — o espírito livre que diz "sim" ao ciclo, à vida e à morte, e que encontra redenção na repetição do instante. Tal como o Dependurado, o iniciado compreende que o sacrifício não é perda, mas expansão de consciência; é a inversão do olhar que transforma o tempo em eternidade.

Assim, esta tiragem fala de mudança e de permanência, de criação e dissolução, e do movimento invisível que une o princípio ao fim. O Mago cria, O Mundo consuma, A Morte transforma, e O Dependurado contempla o mistério. É o ciclo do tempo e da alma — Cronos e Aión em diálogo —, onde a verdadeira sabedoria é reconhecer que tudo o que nasce em nós está destinado a morrer, para que algo maior possa nascer.

Hoje, sob o signo de Júpiter, estas cartas recordam-me que o tempo é tanto devorador quanto mestre.

Ele destrói as formas, mas amadurece a alma.

O Mago inicia a corrente, o Mundo celebra a totalidade, a Morte purifica, e o Dependurado contempla — suspenso no instante, onde tudo acaba e tudo recomeça.

O eterno retorno, afinal, não é repetição, mas revelação: o tempo é o espelho através do qual a alma aprende a reconhecer-se eterna.


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